Memórias e influências espanholas em Manaus

Foto em preto e branco das ruas de Manaus. Grupos de pessoas se reúne em mesas na calçada.
Centro de Manaus em 1904.
Pesquisa explora a presença espanhola na capital do Amazonas, dimensionando a diversidade étnica da comunidade e as atividades empreendidas pelo grupo na cidade

Entre os séculos XIX e XX, Manaus atraiu brasileiros e estrangeiros em razão da exploração da borracha. Os espanhóis estavam entre esses imigrantes que imprimiram sua identidade na região. Em artigo publicado na revista Estudos Ibero-Americanos em julho, a pesquisadora Maria Luiza Ugarte Pinheiro, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), analisou as transformações da sociedade manauara frente à presença espanhola na cidade.

Foto em preto e branco de uma Igreja no horizonte, cercada por palmeiras.

Foto da Catedral Metropolitana de Manaus em 1890. (George Huebner).

Em “A presença espanhola na cidade da borracha”, Ugarte joga luzes sobre a expansão econômica que transformou Manaus na ‘Paris dos Trópicos’, com a chegada de populações estrangeiras e de brasileiros de outras partes do país. A autora explica os dilemas vividos por espanhóis em meio à busca da reconstrução de sua identidade.

Para reconstruir essa história, a pesquisadora analisou periódicos da imprensa étnica no Amazonas entre 1901 e 1922, organizados por manauaras e membros da comunidade espanhola em Manaus. São arquivos do Jornal do Comércio (1908), El Hispano-Amazonense (1901), La Voz da Espana (1901-1907), Centro Espanol (1903) e El Hispano-Amazonense (1918-1922). Juntos, os jornais formam uma base documental da presença espanhola na cidade.

Diante da crescente demanda econômica ligada à inserção da borracha amazônica no mercado mundial, coube às elites da cidade a preparação da infraestrutura da capital, o que incluía atrair mão de obra.

A substituição do escravismo, que na época já passava por crise, aconteceria por meio da imigração, convocada por meio de forte campanha em busca de novos contingentes populacionais. Embora a imigração espanhola não tenha sido expressiva em termos quantitativos, quando comparada com a de São Paulo, Ugarte argumenta que:

Os espanhóis que vieram para o Amazonas imprimiram suas marcas na cidade, fosse com a criação de associações e jornais, fosse com a introdução de novos hábitos culturais. O grosso dessa imigração era constituído pelo gênero masculino, mas também houve deslocamento de famílias e mesmo de mulheres solteiras

A condição social das mulheres espanholas na terra dos barés também é mencionado pela imprensa amazonense no início do século XX. Os escritos desnudam a estrutura da sociedade e o papel legado às mulheres como o de “amas de leite, camareiras, copeiras, cozinheiras e lavadeiras, sendo empregadas tanto por famílias de maior posse, quanto por hotéis, pensões e restaurantes”.

Dentre os fatores elencados por Ugarte para a criação de periódicos e o surgimento de organizações para estreitar afinidades entre espanhóis, está o ambiente hostil a estrangeiros em Manaus. O novo ambiente era “social e culturalmente estranho”, impondo aos espanhóis o aprendizado da língua portuguesa e dos costumes e valores locais.

O desemprego, a falta de garantias e de abrigo foram determinantes para os espanhóis impulsionarem o surgimento de organizações que criassem uma unidade interna. Neste processo, segundo Ugarte, foram criadas “as primeiras agremiações e associações diaspóricas” e os jornais “passaram a constituir uma imprensa comunitária importante que, atuando como verdadeiras redes sociais, propiciada o diálogo, orientava a ação coletiva e fortalecia identidades étnicas no interior da comunidade”.

O legado da imprensa étnica desses imigrantes se encontra em “festas, saraus, conferências e soirées que ganhavam as salas dos teatros, cinemas e cafés, animando frívolas discussões sobre o vestuário feminino as tensões e os conflitos que permeavam a capital e a sociedade amazonense”.
 

“A presença espanhola na cidade da borracha”, de Maria Luiza Ugarte Pinheiro (Ufam), foi publicado em julho de 2021 na revista Estudos Ibero-Americanos. Leia o artigo completo aqui

 
 

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