Vidas verdes importam: um manifesto

Manifesto
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[RESUMO] Manifesto devota atenção ao mundo vivo que nos alimenta, sem o qual não existiria humanidade. O texto é uma proposta de enfrentamento contra as tendências ultraliberais que nos governam. Para avançar na agenda global, depende de mobilização das pessoas comuns.

Aqui não é o espaço de exaltar que, tal como as vidas negras, todas as vidas e todas as cores importam. Nem de chamar atenção para as vidas verdes, para além das vidas negras. Justo pela importância das vidas negras como parte da humanidade que somos, reconhecendo a dimensão estrutural do racismo na sociedade, é necessário compreender e valorizar a importância das várias vidas verdes que nos permitem existir.

Verde aqui não se restringe a plantas, árvores e matas deslocados dos centros urbanos, mas a todo um ecossistema que nos define como humanidade e nos dá sentido como seres que nele vivem e o constituem. Mais que uma visão delimitada e conservadora do meio ambiente, cabe compreender uma dimensão não apenas crítica e sistêmica, ao modo da economia política tradicional, mas sustentável, em torno da qual há que se estabelecer parâmetros e perspectivas para nosso processo civilizatório e de produção do conhecimento.

Trata-se, aqui, de enfrentar uma necropolítica ultraliberal incivilizatória em escala global, que se estabelece mais do que como reação a avanços dos direitos humanos nas últimas décadas. Impõe-se devido à perversa constatação de que o capitalismo não mais prescinde de um grande contingente de pessoas, cabendo apenas a um número restrito de privilegiados sobreviver a desastres causados pela própria exploração desenfreada do sistema, ou ainda, pelo esgotamento do nosso próprio planeta.

Por isso, a histórica articulação dos comuns, que nos constitui militantes e ativistas, necessita ser mais forte e atenta como nunca. Tecer redes, pensando e agindo de forma global, sem tirar os pés no local, torna-se um componente intrínseco a este necessário enfrentamento, bem como assumir uma dimensão política ecossocialista libertária, afirmando direitos humanos em torno não apenas de estados democráticos de direito, mas na relação entre grupos, organizações e movimentos sociais, que se compreendam plurais e diversificados em suas agendas de fortalecimento da participação cidadã.

Cabe identificar a importância de movimentos recentes, como o veganismo, e iniciativas articuladas como a da Friday for Future, impulsionadas pelos últimos relatórios do IPCC — Intergovernmental Panel on Climate Change, que sinalizam o esgotamento de recursos naturais para sustentar a população já em 2050, implicando na falência de nosso projeto como humanidade.

É preciso reconhecer a importância do veganismo no contexto de questões como o uso racional da água e do manejo sustentado de terras que poderiam ser melhor aproveitadas, fosse outra nossa cultura alimentícia e de consumo não destrutivo de outras espécies. É preciso identificar, ao longo de necessárias futuras reflexões, direitos civis, sociais e políticos a serem construídos, afirmados, defendidos, implementados, estabelecidos e aprimorados, pois, mais do que nunca e antes que seja tarde, é urgente afirmar: vidas verdes importam!

Adilson Cabral é professor do Programa de Pós-graduação em Mídia e Cotidiano e do curso de Comunicação Social da Universidade Federal Fluminense (UFF). Coordena o EMERGE — Centro de Pesquisas e Produção em Comunicação e Emergência.
Imagem em destaque: Amazônia Latitude.

 

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