Como ficam as políticas ambientais pós-pandemia?

Pandemia suscita urgência de recuperação de ecossistemas para garantir a estabilidade econômica e socioambiental

 

[RESUMO] A iminência da maior crise econômica do século por conta da Covid-19 coloca em questão o futuro das políticas ambientais. A comunidade científica alerta que fazer da preservação dos ecossistemas uma prioridade política é o melhor caminho para se prevenir a incidência de novas pandemias que abalem as estruturas econômicas e sociais.

Os brasileiros viram sua rotina mudar em meados de março, após a confirmação de que o novo coronavírus (Covid-19) estava em estágio de transmissão comunitária. Apesar de o presidente da república, Jair Bolsonaro, defender que bastava o isolamento vertical (quando apenas membros da terceira idade e de grupos de risco se isolam), contrariando as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), a quarentena foi adotada por parte dos governos estaduais e municipais.

A polêmica tomou forma com a confirmação das previsões resultantes da parcial paralisação econômica: desemprego, instabilidade e retração das bolsas de valores. Uma das opções para manter a atividade econômica é a modalidade de trabalho remoto conhecida como home office. No entanto, em um a país onde o trabalho autônomo, a informalidade e os microempreendimentos correspondem a uma fatia considerável do mercado de trabalho, a desaceleração se mostra ainda mais grave – essa mão de obra que não pode realizar suas atividades remotamente foi temporariamente afastada ou demitida, ficando sem recursos para sobreviver.

Economistas defendem a promoção de políticas estatais anticíclicas, ações que minimizem os efeitos da recessão para evitar que o país quebre, visto a crescente curva de desemprego. Diversos países já adotaram medidas para conter os impactos econômicos da Covid-19, mas no mercado financeiro prevalece a incerteza entre os investidores. Segundo pesquisa de fevereiro da LCA Consultores, o novo coronavírus pode afetar 60% da indústria brasileira, seguindo a tendência apontada pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) em nove de abril, que prevê que as consequências econômicas da pandemia serão as piores desde a Grande Recessão de 1929.

Tendo em vista a urgência dos países em reestabelecerem suas economias e resgatar os empregos perdidos em detrimento do coronavírus, cabe o questionamento: quais serão os destinos das políticas ambientais nesse cenário de recessão econômica?

Amazônia em perigo

O foco das autoridades no combate à doença e nos efeitos da quarentena deram margem ao aumento de ações ilegais na Amazônia. Para além da saída de indígenas das reservas que protegem, houve substancial diminuição das equipes de fiscalização dos órgãos ambientais. O recém exonerado diretor de Proteção Ambiental do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Olivaldi Azevedo, estimou, em entrevista à Reuters, que cerca de um terço dos agentes deixaram de trabalhar em campo.

Apesar de haver intenção de que o trabalho continue, com base em tecnologias de informação e imagem e o apoio das forças de segurança, conforme sugerido em carta da Associação Nacional de Servidores da Carreira de Especialista de Meio Ambiente (ASCEMA Nacional), enviada ao ministro do meio ambiente, Ricardo Salles, pedindo-o que tome as medidas necessárias para proteger os servidores ambientais do contágio do coronavírus, existem questões que dificultam a implementação do novo sistema.

Segundo Cláudio Almeida, coordenador do Programa de Monitoramento da Amazônia e outros Biomas, em entrevista ao jornal ((o))eco, um dos maiores contratempos é a dificuldade de acesso ao banco de dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) para pesquisadores fora do instituto.

“Estamos testando alternativas como fazer cópias off-line do banco, usar um banco localizado em uma ‘nuvem privada’ e outras possibilidades. Essa adaptação não é imediata e ainda não temos uma avaliação do impacto que pode ter, depende por exemplo da qualidade da internet de que cada colaborador dispõe em sua residência”, diz Almeida.

A crise do coronavírus ocorre junto com o início da seca, que é justamente a época em que as queimadas se intensificam, aumentando as nuvens de fuligem, que agravam as crises respiratórias. Segundo dados do Inpe, divulgados no começo de abril, o desmatamento na Amazônia bateu recorde no primeiro trimestre de 2020, se comparado aos últimos quatro anos, quando este monitoramento começou a ser feito. A pesquisa alerta para a perda de cobertura vegetal numa área de 796 km², 51% maior que aquela registrada no mesmo período de 2019, 526 km². Verifica-se que, só em março (início da quarentena no Brasil), houve um incremento de 30% nas emissões de alertas, em comparação ao mesmo mês do ano passado.

Brasília – A AGU (Advocacia-Geral da União), junto ao Ibama e ao ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), cobra na Justiça R$ 1,3 bilhão pelo desmatamento na Amazônia Legal, para exploração ilegal de madeira e atividades irregulares de pecuária. Foto: Ibama/Agência Brasil.

Era esperado que o poder público cumprisse o seu papel, mantendo o monitoramento remoto e apoiando o trabalho do Inpe, do Ibama, do ICMBio e da Polícia Federal. Além disso, ainda não há previsão de retomada dos recursos do Fundo Amazônia, atualmente congelados, para que sejam aplicados nas áreas mais sensíveis. Confirmando seu total desinteresse em proteger a Amazônia e seus povos, o governo federal exonerou o diretor Olivaldi Azevedo, após operação do Ibama em garimpo ilegal, e oficializou as ausências do Instituto e da Funai no Conselho Nacional da Amazônia, órgãos conhecidos pela atuação direta na proteção do meio ambiente e dos Povos da Floresta.

No decreto que recriou o Conselho, em fevereiro deste ano, Bolsonaro o transferiu do Ministério do Meio Ambiente (MMA), ao qual o Ibama e a Funai são submetidos, para à Vice-Presidência, bem como excluiu a participação dos governadores da Amazônia Legal, o que foi muito criticado. No último dia 17, o chefe do Conselho, Hamilton Mourão, assinou uma portaria estabelecendo que a formação do mesmo contaria com 19 militares e deixaria de fora o Ibama e a Funai. A decisão representa um golpe na política de proteção ambiental, bem como na política indigenista, pois é a esses órgãos que os indígenas recorrem para denunciar a presença de invasores nos seus territórios, com o objetivo não só de conter o avanço da Covid-19, mas de evitar o genocídio.

O ex-presidente da Funai Márcio Santilli, em entrevista à Uol, disse que a grande participação de militares representa “uma concepção tutelar militar de desenvolvimento regional, que já se mostrou insuficiente e ineficaz no passado”. Já a ex-presidente do Ibama, Suely Araújo, na mesma reportagem, disse que a ausência de representantes do Ibama no Conselho é muito preocupante, pois “o Ministério do Meio Ambiente optou por designar pessoas que desconhecem os problemas na prática e as dificuldades de operacionalizar políticas públicas na região. Ao que parece, a linha do MMA continua a ser pela inação em termos de política ambiental. É o esperado num governo cuja narrativa desde o início vem estimulando desmatamento e grilagem”.

Violência contra indígenas aumentou sob o governo Bolsonaro. Na foto, Paulo Paulino, líder Guajajara
assassinado no final do ano passado. Foto: Patrick Raynaud/APIB;

Consequências ambientais

Apesar do desmatamento ter aumentado, ainda é cedo para saber qual será a evolução nos próximos meses. Fatores divergentes influenciam a situação, conforme mostrado pelo jornal ((o))eco. Se de um lado há a redução da fiscalização ambiental e o aumento do desemprego, que acaba fazendo com que trabalhadores recorram à ilegalidade, de outro, a diminuição da demanda por commodities agrícolas e a dificuldade de escoar a produção podem reduzir o desmatamento. Da mesma forma, diante da crise no mercado financeiro, há também a valorização de ativos mais seguros como o ouro, devido a sua liquidez, e a terra. No entanto, ao passo que é preciso um certo capital para ocupá-la com algumas cabeças de gado, no momento, há menos dinheiro circulando.

A pecuária, principal motor do desmatamento na Amazônia, tende a sofrer com a crise. Do ponto de vista nacional, como a carne de gado é mais cara, com a crise, há uma tendência em substituí-la por opções mais baratas. Do ponto de vista internacional, o país pode ser isolado por um cordão sanitário. “Quem vai querer comprar carne de um país totalmente contaminado?”, questiona Vladimir Safatle à Agência Pública. De toda forma, parte do desmatamento é especulativo e o momento de crise pode suscitar oportunidades: desmatar e ocupar agora para vender mais adiante, quando o preço subir.

Para o pesquisador e professor titular do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), referência internacional no estudo de aerossóis atmosféricos, considerado um dos cientistas mais influentes do país, Paulo Artaxo, é impossível prever o que vai acontecer, não só em relação ao coronavírus, mas ao próprio governo. Acredita ser cedo demais para fazer quaisquer conjecturas. Pelo fato de estarmos no meio de uma crise, avalia em entrevista à Amazônia Latitude, tudo que hoje é dito provavelmente não fará o menor sentido amanhã.

Segundo o professor, o governo brasileiro não tem a menor motivação ou intenção de proteger a saúde da população, como deixa bem claro em suas ações. Afirma, então, que a proteção da Floresta Amazônica e de seus povos não só não é uma preocupação atual, como duvida que venha a ser no futuro. No entanto, pondera que, globalmente, esse assunto vai dominar a pauta ambiental e de saúde nos próximos meses. “A preservação dos ecossistemas naturais é absolutamente estratégica para que a gente possa efetivamente proteger a saúde da população contra novas pandemias”, complementa Artaxo.

Pandemia como reflexo da destruição ambiental

Ambientalistas apontam, em reportagem do jornal O Globo, que, diante da pandemia, percebe-se que “o mundo não está preparado para a crise climática, que acometerá o planeta nas próximas décadas, caso nenhuma medida seja tomada contra o aquecimento global”. Além desta ser considerada apenas o começo das pandemias em massa, o cenário previsto também conta com grandes estiagens, ondas de calor, aumento do nível do mar e inundações, tendo, como consequência, gigantescos deslocamentos populacionais.

A comunidade científica vem comprovando a relação de causa e efeito entre a degradação ambiental e o surto de coronavírus. Segundo Carlos Nobre, cientista da área climática e pesquisador do Instituto de Estudos Avançados da USP, entrevistado pela Amazônia Latitude, com a perturbação do ambiente, estamos encurtando o tempo entre a saída de microrganismos e a chegada no corpo humano como elementos destrutivos. O pesquisador explica que esse processo existe em toda evolução, mas o nível de degradação ambiental tem acelerado o mesmo.

Os incêndios aceleram a extinção de várias espécies. o que aumenta a possibilidade para o surgimento de novos vírus. Foto: Amazônia Latitude.

Nobre afirma que a perturbação do ambiente está na gênese das pandemias. “Se continuarmos e não controlarmos as mudanças climáticas, todos os ecossistemas tropicais que contêm essa riqueza genética de vírus, bactérias e protozoários ficarão cada vez mais fora de controle”, alerta. Ele demonstra as progressivas consequências, por exemplo, dos focos de incêndio em florestas tropicais. A interação dos microrganismos de animais que viviam em equilíbrio no seu habitat passa por uma modificação, devido ao grande estresse que enfrentam. Forçados a procurar comida em outro lugar, esses animais chegam perto de habitações humanas. Isso contribui para que os seus microrganismos cheguem nos humanos de forma bastante disruptiva.

Para o cientista, portanto, as pandemias são causadas pela destruição de ecossistemas florestais, a aproximação de concentrações urbanas em áreas naturais e a velocidade de deslocamento populacional, tendo em vista o desenvolvimento tecnológico dos transportes.

“Antes, uma perturbação no corpo humano era muito isolada, podia dizimar uma aldeia, um pequeno grupo de seres humanos… desde a peste negra, aquilo que podia ser uma endemia muito localizada tornou-se epidemias e pandemias. Com os transportes a jato, as pandemias surgem em dias e semanas”, acrescenta.

O relatório “Fronteiras” (UNEP Frontiers Report) sobre questões emergentes de preocupação ambiental do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) de 2016 mostra que as zoonoses (doenças infecciosas transmitidas entre animais e pessoas) ameaçam o desenvolvimento econômico, o bem-estar animal e humano e a integridade do ecossistema. Exemplos de doenças zoonóticas que ameaçaram causar grandes pandemias nos últimos anos foram o Ebola, a gripe aviária, a febre do Vale do Rift, a febre do Nilo Ocidental e o Zika Vírus. Segundo esse relatório, nas últimas duas décadas, essas doenças custaram mais de US$ 100 bilhões, cifra que poderia ter chegado a trilhões, caso os surtos tivessem se tornado pandemias humanas.

Em outro relatório, “Pesquisa de Programas de Zoonoses nas Américas” (A Survey of Zoonoses Programmes in the Americas), a OMS aconselha que os Estados devem fortalecer os programas nacionais de prevenção, vigilância, controle e eliminação das zoonoses, considerando fatores como mudanças climáticas, desmatamento, incêndios florestais e consequentes perdas de biodiversidade. Nesse sentido, o jornal Jota trouxe uma importante contribuição ao divulgar que “Justamente no ponto de eclosão da pandemia do novo coronavírus, na província chinesa de Hubei, onde se localiza a cidade de Wuhan, dados da Global Forest Watch mostram que as suas oito principais regiões foram responsáveis por 53% de toda a perda de cobertura arbórea entre 2001 e 2018, indicando, só até a semana de 16 de março de 2020, novos 435 alertas de incêndio florestais na região”.

Tomando como exemplo o caso da China e considerando a ascensão do desmatamento no Brasil desde 2013, estamos potencializando o cenário de zoonoses. Assim, para que não tenhamos que vivenciar o surgimento da próxima pandemia no território nacional, é crucial o fim do desmatamento amazônico. É importante lembrar que a Floresta é fundamental para o bom funcionamento de todo o regime hidrológico de chuvas no Brasil, do qual depende, inclusive, o agronegócio, que, por sua vez, é responsável por parte considerável do PIB brasileiro. Se não mudarmos essa prática, o desmatamento nos fará contabilizar, num futuro próximo, novos prejuízos socioambientais e econômicos.

Foz do Iguaçu/PR – Maior conjunto de quedas d’água do mundo, as Cataratas do Iguaçu registram a menor vazão de água do ano,
numa das estiagens mais severas dos últimos 50 anos. Foto: Cassiano Rolim/RPC/G1

Destino das políticas ambientais

Posto o cenário mais pessimista, há quem veja a crise com otimismo, encarando-a como uma oportunidade. Carlos Nobre, por exemplo, aponta para a raridade da postura anticiência no enfrentamento da pandemia. Além do Brasil, pontua, só a Bielorrússia, o Turcomenistão e a Nicarágua, que também possuem presidentes com perfis populistas e autoritários, desprezaram as recomendações da OMS no combate ao novo coronavírus.

Embora alguns líderes, num primeiro momento, tenham sido hesitantes, como o presidente estadunidense, Donald Trump, o primeiro ministro britânico, Boris Johnson, e o prefeito de Milão, Giuseppe Sala, bastou o agravamento da situação para que mudassem de posição. Nesse sentido, Nobre defende que, considerando que a maior parte dos países demonstrou respeitar o valor do conhecimento científico, o caminho para sair da crise tende a ser através de uma economia verde. Para o cientista, o papel das potências do hemisfério norte será determinante.

Entrevistado pela Amazônia Latitude, o economista e professor Marcos Arruda, coordenador do Instituto de Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS), e investigador associado do Transnational Institute, ressalta o caráter especulativo de tudo que for discutido sobre o cenário pós-pandemia. A crise da Covid-19 chocou todos os lados da constelação civilizatória, uma vez que atingiu todos os aspectos da vida humana, inclusive a sua própria existência.

Apesar de estarmos no escuro, o professor afirma pertencer ao “lado daqueles que defendem a ideia de um outro mundo e um outro Brasil possíveis, reorganizados não mais em torno do lucro e do dinheiro, mas do bem viver dos seres humanos; reorganizado a partir de uma visão biocêntrica, em vez de antropocêntrica”. Para Arruda, todos que estão deste lado da cerca se sentem desafiados a encontrar novos caminho, justamente por verem as bárbaras consequências na vida humana de um sistema que é, por natureza, “da morte e não da vida”.

Nobre diz estar prestando muita atenção às discussões que vêm sendo feitas na Europa e acentua o peso que a eleição dos Estados Unidos terá em novembro. O pesquisador tem acompanhado na imprensa as notícias sobre a proposta de superar a crise a partir de um caminho verde, projeto que vem sendo conhecido como Green Deal (Acordo Verde, em tradução livre). Ele acredita que é possível aproveitar a crise mundial para fazer do equilíbrio dos ecossistemas prioridade máxima. Dependendo de como for a resposta das outras nações, incluindo a China, país onde surgiram duas das três maiores pandemias das últimas décadas (Sars, em 2003, gripe aviária, em 2004, e Covid-19, em 2019), o pêndulo mundial pode balançar, fazendo com que os países que não tomem a trajetória verde sejam marginalizados, afirma.

Apesar de não poder prever o futuro, o cientista defende que a pandemia traz a necessidade da tomada de decisão. Antes, havia uma postergação infindável; nas suas palavras, “um empurrar com a barriga eterno”. Apesar de a Europa e o Japão, desde antes da Covid-19, liderarem a iniciativa sustentável, hoje vê-se que ela se tornou um desafio global que exige posicionamento imediato. Quando questionado sobre o Brasil, responde desacreditado: “este já perdeu o fio da meada faz tempo”.

Belém/PA – Aderindo à Greve Global pelo Clima, movimentos sociais, representantes de indígenas e de instituições públicas realizaram um ato em 2019, simultaneamente com outras cidades do Brasil e do mundo. Foto: Fernando Araújo/Diário do Pará

Por sua vez, Arruda defende que o time contrário ao meio ambiente está muito mais apavorado do que nós, pois não imaginava que aconteceria qualquer coisa para abalar a estabilidade dos poderes constituídos. “Eles estão vendo todas as debilidades do sistema do capital e todas as consequências no planeta, não só na vida humana, mas em todas as formas de vida; nos ecossistemas e nos biomas. O rei está nu”, certifica. O fato de tudo isso ter se tornado visível, complementa, faz com que, mais do que nunca, seja possível atribuir essas consequências a um sistema de organização da sociedade e não a problemas pontuais. Para o economista, portanto, trata-se de uma oportunidade para se construir uma nova agenda.

No campo econômico, Arruda aponta para a queda de todos os circuitos de valor que formam esse sistema. Segundo o professor, o discurso de que é preciso terminar a quarentena e que todos devem voltar ao trabalho, como se vê no Brasil, em detrimento do colapso da economia, apenas revela o grau de dependência que o sistema tem em relação ao trabalho humano. Defende que a situação é oportuna para a classe trabalhadora tomar consciência do seu poder. Para além disso, o economista afirma que se há um lado positivo na crise da Covid-19 é o do meio ambiente. Justifica sua afirmativa com menção à redução espantosa das emissões de gases estufa durante o período de quarentena. Para ele, a ideia fixa de que o crescimento ilimitado é a única maneira de se fazer economia é absolutamente insustentável.

Outra questão do campo econômico que teve impacto no meio ambiente, segundo Arruda, foi a crise da guerra comercial travada entre dois impérios, um agressivo militarmente, os Estados Unidos, e outro comercialmente, a China. O professor afirma que a desaceleração forçada desta disputa promoveu a purificação dos oceanos, tendo em vista a espantosa redução da circulação de bens e serviços pelo mundo. A maior parte do comércio internacional, que inclui petróleo, alimentos e todos os tipos de produtos industriais é feita através dos mares.

O economista também lembra o recente crime ambiental de derramamento de petróleo na costa brasileira, para dizer que este foi apenas um entre outros acidentes petroleiros ou de exploração de águas profundas. Denuncia a “loucura” completa de um sistema antivida, que produz alimentos em lugares distantes, cujo transporte até a mesa das pessoas é responsável por uma alta pegada de carbono, para relacionar com o aumento da temperatura das águas marinhas, das migrações da vida ali existente e da destruição das espécies, todos consequência das emissões de gases estufa e do aquecimento global.

Marcos demonstra, ainda, que a crise também tem a capacidade de abalar a consciência das pessoas para o consumo. Na China, país cujo povo já usava máscara antes do vírus, por conta da poluição, agora, sem a atividade econômica a todo vapor, percebe o ar mais limpo. Apesar de persistir a necessidade do uso da máscara, a sua razão mudou e a população se dá conta disso. Não sabe, no entanto, se a situação também abala as autoridades. O mesmo pensa em relação ao Brasil. Apesar de haver uma iniciativa de se investir no reflorestamento intensivo da Amazônia, com fundo de vários países do hemisfério norte, não acredita que seja possível com a floresta sob tutela de um governo destruidor.

Embora haja uma forte pressão externa, do lado de cá temos “o totalitarismo ambiental mais indecente e destruidor”, sintetiza. Arruda diz não saber como será possível enfrentar toda essa duplicidade e contradição. Entrando na seara política, afirma não ser possível resumir a discussão. O economista, no entanto, acredita na união de diversas forças populares na construção de um outro Brasil. Para ele, é indiscutível a necessidade de se eleger uma nova classe política, para que a pauta ambiental possa avançar ainda mais.

 

A imagem em destaque é uma arte de Fabrício Vinhas, designer da Amazônia Latitude.

 

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