Fundo Amazônia: o anúncio do fim e o que veio depois

Cruzada ideológica do governo compromete Fundo Amazônia e gera nova polemica ambiental

Em mais um episódio de polêmica sob o discurso de modernização e combate a ideologias, o Fundo Amazônia entrou para o rol de espécies ameaçadas de extinção no Brasil de 2019. O fim do programa, criado em 2008 e que soma R$ 3,4 bilhões recebidos, foi anunciado pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em uma reunião com os principais doadores, Noruega e Alemanha, no dia 3 de julho.

As manchetes do dia repercutiram a perplexidade diante do risco. Embaixadores dos países e o ministro admitiam a possibilidade do Fundo acabar, no G1, na Folha de São Paulo e no Valor Econômico. 

Um movimento de repercussão negativa foi a extinção do Comitê Orientador do Fundo Amazônia, o COFA, junto com outros conselhos por parte do governo. Quando recuou, não incluiu o COFA e seu comitê técnico na lista dos órgãos que seriam recriados. 

Semanas antes, as mudanças propostas para a área chefiada por Salles —condenado por fraude ambiental às vésperas de assumir o cargo— geraram reação negativa dos grandes doadores do Fundo.

O Poder 360 relatou que a Noruega, que doou mais de 90% do valor total do fundo, permaneceria no programa se o foco fosse o combate ao desmatamento, já que Salles indicou interesse de utilizar os recursos para outros fins, como indenizações a donos de propriedades privadas localizadas em unidades de conservação. 

Os recursos são geridos pelo BNDES, modelo que deve ser mantido, segundo Alemanha e Noruega. O Banco informou que existe hoje uma carteira de 103 projetos, que somam aproximadamente R$ 1,9 bilhão, conforme reportagem do site O Eco.

No texto, que apresenta respostas da Embaixada da Alemanha no Brasil e de entidades ambientais às acusações de irregularidades em contratos com ONGs, o tom de perplexidade é claro. Salles disse, em coletiva realizada no dia 16 de maio, que havia problemas em 100% dos contratos com ONGs, tendo analisado apenas 30 dos 103 projetos. 

O ministro, porém, não detalhou os contratos com problemas, qual a metodologia utilizada na avaliação e quem foi responsável pela análise, diz a reportagem. Suas afirmações foram desmentidas por meio de carta assinada por Noruega e Alemanha, que afirma que o BNDES realiza auditorias anuais e que são unânimes no reconhecimento do bom uso dos recursos e na verificação dos impactos do trabalho realizado. 

Então presidente do BNDES, Joaquim Levy falou sobre os riscos da extinção do Comitê durante depoimento em junho a uma CPI que investigava possíveis irregularidades no Banco. Entre eles, a ausência de uma estrutura de governança que era considerada satisfatória pelos participantes do Fundo. 

A matéria do Globo cita que Salles resolveu editar um novo decreto apenas quando houver consenso sobre as finalidades possíveis de aplicação dos recursos. Ainda, o governo da Alemanha não gostou da manifestação de Salles para editar as regras de destino do dinheiro sem comunicar os países doadores, assim como a extinção do Comitê Orientador e do Comitê Técnico. 

O que o Brasil perde?

Reportagem do UOL descreve que foram investidos R$ 56 milhões em um projeto do Ibama para monitoramento e combate de focos de desmatamento na Amazônia, utilizando principalmente os dados do software Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, que tem sofrido ataques recentes de Jair Bolsonaro por causa de seu trabalho sólido e criterioso.

Matéria do Jornal Nacional lembra que o Cadastro Ambiental Rural, que registrou 746 mil propriedades rurais no país, também depende de recursos do Fundo, que são repassados aos estados para apoio nas ações de cadastramento. O Amazonas deveria receber cerca de R$ 30 milhões para o CAR em julho, mas a verba não chegou. 

Procurada pelos veículos nas diversas reportagens que têm sido produzidas, o ministério não se pronuncia ou sinaliza vagamente que as negociações estão em andamento, movimentos distantes às promessas de mais diálogo, afinco e sinergia feitas pelo atual chefe da pasta de meio ambiente. 

O que se depreende da cobertura é a perplexidade em face da concretização paulatina da política anti-ambiental do governo, que representa riscos para a manutenção da floresta Amazônica e seus agentes humanos e não humanos que a ocupam.

 

A ilustração em destaque é de Sandro Schutt, ilustrador e editor de conteúdo da casa. Nela, estão caricaturados Ricardo Salles (Ministro do Meio Ambiente), Jair Bolsonaro (Presidente da República), e um fazendeiro genérico.
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