American Experience: Into the Amazon

Capítulo 1 de American Experience: Into the Amazon, disponível na íntegra no Youtube.

American Experience: Into the Amazon narra as infames desventuras de Theodore Roosevelt e Cândido Rondon no coração da Amazônia brasileira para mapear o bem denominado Rio da Dúvida, em 1913-14. Esse episódio é parte de uma série da PBS, intitulada American Experience (Experiência Americana), que está há cerca de 30 anos no ar. Ela foi publicada dizendo ser um produto que “traz à vida as incríveis personagens e histórias épicas que moldaram o passado e o presente americano”.

O título “Experiência Americana” é adequado, uma vez que a perspectiva americana, inevitavelmente, enquadra a experiência da audiência. Por 113 minutos, acompanhamos a jornada dos exploradores dentro da Amazônia, alternando entre reconstituições monocromáticas – interpretadas por Alec Baldwin atuando como Roosevelt e Wagner Moura como Rondon – e entrevistas recentes com alguns dos principais pensadores a respeito de Roosevelt, Rondon, além da viagem em geral. Nas encenações, o diário do principal aventureiro é usado como motor da narrativa. Roosevelt explica a importância e o significado de “explorar a selva”, e Rondon reitera sua dedicação à missão de proteção aos povos indígenas e de mapeamento da Amazônia. O filme começa com a contextualização da derrota de Roosevelt nas eleições de 1912, fala sobre o fim da era de ouro da exploração e o impulso de Roosevelt em testar seus limites físicos pelos desafios da selva.

Paralelo a esses fatores externos, o filme começa a jornada no meio da selva. A floresta é enfocada de algumas maneiras bem estereotipadas como, por exemplo, é apresentada como sendo uma voraz devoradora de homens, um território selvagem hostil e um inferno verde ou um “paraíso suspeito”, como sugeriu Leopoldo Bernucci. Povos indígenas são descritos como “semelhantes a Adão e Eva” que povoam a floresta. Os insetos microscópicos que importunam os integrantes do grupo, chegando a enlouquecê-los, acabam por ser o fator mais prejudicial. Conforme a expedição avança na mata, eles são confrontados com um obstáculo após o outro. Um exemplo é Rondon, descendente de indígenas, que, através de sua visão Positivista, tem uma rígida aproximação pacifista com povos indígenas acreditando que eles precisam ser trazidos gradualmente para a civilização. Roosevelt, por outro lado, enquadra seu conceito de povos indígenas nas violentas experiências que teve no sudoeste dos Estados Unidos, em uma crença sólida de que os povos indígenas deveriam ser protegidos pelo estado.

Para além de suas aproximações com os povos indígenas, seus estilos de liderança também diferem. Rondon é profundamente dedicado a mapear o Rio da Dúvida, enquanto Roosevelt, depois das provações e tribulações de doença, desconforto e dois casos de morte, quer manter a expedição em movimento.

O filme faz um bom trabalho oferecendo o contexto histórico necessário com a perspectiva americana, trazendo protagonistas de diferentes estilos de liderança. O filme mal faz críticas à expedição e aos dois homens. As cenas finais mostram os protagonistas recebendo prestigiosas medalhas de honra da Royal Geographical Society in England (Sociedade Geográfica Real da Inglaterra), conclamando-os como heróis do mais alto grau. Enquanto uma rica história de jornada é oferecida ao espectador, incluindo a morte de um trabalhador por conta da desobediência de Kermit (filho de Roosevelt) à autoridade de Rondon, o contexto amazônico, os povos indígenas, a políticas brasileiras durante a época e a relação internacional entre os dois países passam quase despercebidos  – pontos que teriam enriquecido a experiência do espectador americano ou não.

A viagem é interessante por conta das dramáticas desventuras de um dos homens mais famosos do mundo no coração da selva, mas também pelo poder representativo das relações entre Brasil, Estados Unidos e a Amazônia amplamente. Esta ultima, especialmente durante as encenações em preto e branco, é ofuscada como pano de fundo no qual Roosevelt pode testar sua masculinidade. Enquanto não duvido que isso era sua própria compreensão da terra pela qual teve sua derradeira grande aventura, acredito que o documentário sobre a viagem deveria, ao menos, oferecer um aceno em direção a debates para contextualizar a Amazônia e os povos indígenas no período em que se deu a viagem – a fase final do ciclo da borracha. Apesar de tudo, o filme oferece um bom – e relativamente divertido – panorama para qualquer um interessado nessa expedição. Entretanto, para aqueles interessados em uma visão crítica sobre relações internacionais e representações da Amazônia, procure em outro lugar.

 

Você pode conferir o texto original em inglês clicando aqui.

 

Jessica Carey-Webb foi Indicada como Defensora da Causa para o Projeto para a América Latina do Conselho de Defesa dos Recursos Naturais. Conquistou seu PhD em Estudos Culturais pela Universidade do Texas (Austin) em 2018. Especializou-se em Estudos Culturais na Amazônia e, atualmente, trabalha na produção de um livro que examina o desenvolvimento da Amazônia durante o boom da borracha através de lentes ecocríticas e transacionais.
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